terça-feira, 2 de outubro de 2012

O incrivel caso das azeitonas pretas




O incrível caso das azeitonas pretas
Por Raúl Candeloro
Anos atrás, fui convidado a fazer uma série de treinamentos para uma equipe comercial de um grande atacadista de alimentos. O pessoal tinha acabado de receber um palm top e ainda tinha gente se familiarizando com ele (lê-se: muitos ainda não o usavam). A lista de produtos que um vendedor tinha para oferecer aos clientes passava dos 10 mil itens. Obviamente, como é frequente nesses casos, a maioria deles vendia, nesta ordem:
a)   O que o consumidor pedia.
b)   O que estivesse em promoção.
c)   O que estivesse em campanha de vendas.
O incrível caso das azeitonas pretas aconteceu na primeira reunião que fizemos, quando, em um exercício proposto, um dos vendedores se levantou e fez um discurso inflamado dizendo que daquele jeito não dava, que a empresa era uma bagunça, que a logística e a entrega não funcionavam, que ele se matava para cativar os clientes e que depois a companhia estragava tudo… enfim, que seria difícil bater a meta. Surpreso, perguntei se ele poderia dar um exemplo mais específico, e ele na hora disparou a pérola: “Falta azeitona preta, e todo mundo sabe disso! É um absurdo, não pode faltar azeitona preta! Isso acaba com a gente!”.
Um dos diretores se levantou, explicou que realmente havia um problema com o fornecedor das azeitonas, mas que o assunto já havia sido resolvido e que a partir daquela semana a entrega estaria normalizada. Eu fiquei olhando, olhando… e não me aguentei. Na época, eu era mais afoito, menos sutil, e dei uma chapuletada (esse é um termo técnico!), simplesmente usando o método socrático de fazer perguntas:
— Quantos itens você tem na sua lista de vendas?
— Mais de 10 mil.
— Desses, quantos estão faltando?
— Só a azeitona preta.
— Com o restante dos produtos, está tudo o.k.?
— Olha, de vez em quando atrasa um ou outro, mas isso é normal…
— Quanto a azeitona preta representa do seu faturamento mensal?
— Sei lá, nunca calculei.
— Então calcule agora, comigo, porque, se você está reclamando assim, deve ser importante. Quanto, mais ou menos? 1%? 5%? 10%?
— Ah… menos de 1%, com certeza. Não deve dar nem meio por cento.
— Quanto da sua meta você conseguiu alcançar no mês passado?
— 82%.
— E a azeitona preta é a culpada?
Bom, você já deve imaginar o fim da história. Lembrei-me do caso porque recentemente aconteceu algo bem parecido em um workshop para representantes, quando um deles reclamou de ter perdido a venda de um produto em razão de dois centavos. Comecei a fazer perguntas novamente: quantos produtos têm no mix quantos você perdeu por dois centavos, quanto eles representam, etc.
As respostas são sempre constrangedoramente amadoras. A verdade é que muitos vendedores têm o foco no problema, e não na solução dele. Reclamar que o concorrente vende por um centavo mais barato adianta? Não. Reclamar que um dos produtos está em falta adianta? Não. Enfim, estão reclamando do quê?
A impressão que dá é que as pessoas que reclamam sentem-se importantes com isso e o que querem mesmo é chamar atenção. O que não entendem é que estão chamando atenção pelo motivo errado. Pare para pensar no que você prefere: receber atenção por reclamar ou por obter resultados positivos? Por reclamar ou por resolver um problema? Por reclamar ou por bater a meta?
Da próxima vez que se pegar reclamando do que não tem, lembre-se do incrível caso das azeitonas pretas, quando um vendedor com 10 mil produtos para vender reclamava de não ter um deles (em vez de focar nos outros 9.999 que tinha!).
Abraços e boas vendas!